Boa tarde,
Voltamos nesta tarde de sábado - aniversário da Sociedade Esportiva Palmeiras - 103 anos! - , após
um breve passeio e descanso aqui na represa de Santa Cruz da Conceição – SP,
onde moro, para falarmos dos 50 anos de THE PIPER AT THE GATES OF DAWN, o maior
disco psicodélico da história e, sem dúvida nenhuma, um dos maiores da história
do rock.
É simplesmente, para mim, o terceiro
maior, ficando atrás apenas de Sgt. Pepper’s e Dark Side of the Moon.
Para vocês que leem meu blog e pouco
estão familiarizados com história de bandas de rock etc., vamos conversar um
pouco sobre o Pink Floyd, minha segunda banda, ou a primeira, já que os Beatles são "hors concours"...
Uma das primeiras fotos da banda, já sem Bob Klose... 1966... |
Todo mundo já ouviu alguma música
desta banda formada em Cambridge, cidade conhecida por sua referência
universitária, que fica ao leste da Inglaterra. E foi nessa Universidade, de
Cambridge, que os rapazes – Syd Barrett, Roger Waters, Nick Mason, Richard
Wright e Bob Klose - reuniram-se para
formar uma banda de rythm’ blues, no ano de 1965.
Não vou alongar-me muito nestas
considerações porque basta um “clic” e vocês poderão ter farto material de qualidade a respeito (e, claro, em se tratando de "internet", muita asneira, também). Mas o fato é que o Pink Floyd não é só "de ual", "uixi uar rir" e "monei", como se diz e pensa-se ouvir por aí... Aliás, se as pessoas se dessem mesmo ao "trabalho" para ouvir esse disco na íntegra, com certeza teriam muitos exemplares para serem vendidos a troco de banana mundo afora...
Apenas uma leve introdução, para que
possamos entender porque o Pink Floyd é a maior banda psicodélica da história e
uma das principais precursoras do rock progressivo, que é também minha vertente
do rock favorita. Entender como eles inventaram o rock psicodélico (e a própria
expressão, para definir aquilo que faziam, antes da gravação do LP), e, como,
também, desaguaram no rock progressivo, que é a consequência natural deste tipo
de som.
Ah, e repito: o Pink Floyd não é banda de heavy metal e não é banda tipo "Led Zeppelin" e "Black Sabbath". O Pink Floyd é uma banda de rock progressivo. Não tem absolutamente nada a ver com "usar preto", etc.
Disse-lhes que o Pink Floyd surgiu em
1965. E com um cara “estranho”, ali: Bob Klose. Trata-se do primeiro
guitarrista da banda e a peça que lhe dava um toque de blues. A saída dele
deve-se ao fato de a banda caminhar o seu som para longe do blues – que não
faziam muito bem – e seguir em frente nas experimentações ao vivo que vinham
fazendo, porque havia outras bandas que eram melhores fazendo aquele tipo de
música na Inglaterra, principalmente os Rolling Stones, por exemplo, e claro, o Cream. Ao assistirem a um show do Cream, na primavera de 1966 (outono, para nós), chegaram a conclusão
que não iam a lugar nenhum fazendo este tipo de som.
esta é de 1965, com Bob Klose (o primeiro, da esq. para direit) quando o Pink Floyd ainda nem se chamava "Pink Floyd"... "Sigma 6"... |
Então, com a saída de Klose, no começo
de 1966, o Pink Floyd – nome de dois bluesman’s norte-americanos de que Syd
Barrett era fã: Pink Anderson e Floyd Cuncil – estava pronto para assombrar o
“underground” londrino com seu show de som, luzes e fúria.
Vale lembrar que, em 1966, a
Inglaterra estava eufórica e Londres fervilhava, principalmente no verão, com a
conquista da Copa do Mundo. E fervilhava também em seu “underground”, nos
clubes londrinos, onde a experimentação estava na ordem do dia. Deem uma
olhadela em minhas outras postagens, que falam sobre Pepper’s.
A banda “do momento”, naquele espaço –
e no espaço sideral!!! – era o Pink Floyd, meu irmão!!!
O Pink Floyd era essencialmente uma
banda de shows noturnos, que tocava em clubes de Londres e começaram a ser
notados, fora disso, por Paul McCartney, como eu já havia dito das postagens
anteriores. Remeto-lhes novamente à leitura de Pepper’s (sim, para entender
Pepper’s, precisamos entender o Pink Floyd, e não o contrário!).
Eles não tinham grandes pretensões
comerciais, fruto da mente extraordinária de seu fundador: Roger Keith Barrett,
ou Syd Barrett, um dos maiores gênios da história do rock. É com Syd e por Syd
que o Pink Floyd se formou e constituiu-se na maior banda psicodélica da
história. E, claro, uma das maiores do mundo.
foto também de 1966. |
Passo agora a transcrever alguns
trechos do livro de Clinton Heylin, “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band – Um
ano na vida dos Beatles e amigos”, para que possamos partilhar um pouco de tudo
isso. Recomendo a todos a leitura deste livro, porque, o autor consegue abordar todo o universo, dentro de um ano, das principais bandas e músicos que são os pilares de tudo o que o rock fez, a partir da segunda metade dos anos 1960 até os dias de hoje. Não é possível entender os caminhos que tomou o rock e entender as bandas e os músicos que lhes sucederam sem conhecer e estudar o contexto sob o qual essas bandas e músicos surgiram.
Vocês não conseguiriam entender o Led Zeppelin, o Deep Purple, o Black Sabbath, o Uriah Heep ("quarteto de ferro inglês"), Queen, Rolling Stones... as bandas de Seattle do início dos anos 1990, o Punk, o pós-Punk, o eletrônico, o gótico, o metal... Metallica, Motorhead e suas variantes... as bandas americanas, tipo Kiss, Aerosmith, Tears for Fears... as bandas australianas, tipo AC/DC, INXS, Midnight Oil... as alemãs, tipo Scorpions... as bandas dos terríveis e comerciais/decadentes anos 1980 (com raras, mas raras exceções)... só para citar as mais conhecidas...
Sem nos esquecer, é claro, dos músicos do rock... Elton John... Alice Cooper... David Bowie...
O rock é tal como conhecemos, por ter existido a segunda metade dos anos 1960, numa certa cidade famosa, fria, cinzenta, que chove a qualquer hora do dia, que venta pra dedéu, conservadora, maluca, arrojada, atemporal, progressista, punk, histórica, moderna, antiga... Em um país que no deu as melhores bandas de rock de todos os tempos!!!!
Vou colocar as citações em azul, para melhor identificarmos a narrativa de Clinton Heylin: Curtam a viagem psicodélica por parte da história do rock!!!
Em dezembro de 1966, o circuito de
shows estava pronto para a ‘grande virada’. Clubes dedicados a um determinado
tipo de banda pop, com longos shows começando na madrugada, desafiavam
estabelecimentos já testados e aprovados. O resultado, em mais de uma ocasião,
era uma noite como a que June Bolan descreveu para Jonathon Green: ‘Eram três
shows por noite: um no clube chamado Rikki-Tik, em Windsor, e outro no Rikki
Tik, em Hounslow, e o terceiro, às duas da madrugada, era no UFO, em Tottenham
Court Road’. A banda em questão era The Pink Floyd [ainda com o “The”], que no
começo de 1967, estava na mais difícil das cordas bambas: manter seu status
underground alcançado a duras penas e, ao mesmo tempo, empolgar o público pop.
O Pink Floyd, segundo Miles [vide minhas blogagens], ‘era exatamente do que
(Paul e eu) falávamos’.
Foi no inverno de 1966 que um novo
empreendimento, num local conhecido no Soho, deu início ao esquema. Num domingo
preguiçoso de janeiro, no Marquee [outro clube londrino, em que o Pink Floyd
era a atração principal, na época], algo psicodélico começava a dar os
primeiros passos. E uma daquelas conexões underground de Londre – Nova York foi
responsável pelas primeiras reverberações [vide, também, minhas blogagens de
Revolver e Pepper’s]. Steve Stollman se mudou de Nova York para Londres no
final de 1965 e passou a exercer a função de caça-talentos para a ESP, de seu
irmão Bernard, a mesma gravadora de jazz que acabara de fechar com os Fugs o
que o líder do grupo Tuli Kupferberg chamou de ‘um contrato estranho e
aprisionante [...] com uma das piores porcentagens [royalites] da história da
civilização ocidental’. Por conhecer muito pouco da cena londrina, Stollman
elaborou um plano para que o underground local fosse até ele:
Miles: a ideia [do Steve] foi, em vez
de correr atrás [das bandas underground] e espera-las aparecer, para que ele as
contratasse [para a ESP]... [E apareceu] The Pink Floyd Sound – estava escrito
assim no amplificador, e alguém projetava neles um filme feito por um paraplégico
numa cadeira de rodas indo a toda velocidade por Londres. Eles gostavam
bastante desse efeito. Eles mandaram bem... Ainda tocavam [rythm & blues]
[...] Eles começavam a tocar, faziam introduções bem rápidas e então vinha uma
longa improvisação psicodélica até que, de algum jeito, eles voltavam aos
acordes. E aí entrava mais algum clássico de r & b. Era bem bizarro... Acho
que foi na mesma noite em que tocou o AMM. Syd observou atentamente o que [o
guitarrista] Keith Rowe tocou, e criou seu estilo de guitarra a partir disso.
Para infelicidade da gravadora de seu
irmão, Steve não sabia bem o que procurar. Embora tudo indique que o Floyd
tenha tocado em todos os Sunday Spontaneous Happenings (inclusive o primeiro,
batizado de Giant Mystery Happening, em 30 de janeiro) – claramente inspirados
em ‘happenings’ semelhantes de Nova York, apesar de isso implicar que ele tinha
de alugar uma tarde inteira no Marquee – a banda não foi contratada pela ESP.
Durante o inverno e a primavera [de
1966], o Floyd desfrutou da oportunidade de fazer apresentações quinzenais no
mundialmente famoso Marquee, já que Stollman levou sua experiência adiante até
o começo de junho. Naquele que foi o último Spontaneous Happening, ou show
particular não documentado, Peter Jenner [futuro empresário do Pink Floyd], um
professor iniciante da London School of Economics, vizinho do deus da guitarra
Eric Clapton, concedeu-se uma pausa nas correções de provas e foi curtir um
‘show louco no Marquee, organizado por gente como Steve Stollman e Hoppy’ em
busca de uma tarde de atonalidade. O que viu marcou o fim de sua carreira
acadêmica. Era mais um jovem brilhante empreendedor cheio de energia e
apaixonado pelo potencial pop que jogava tudo para o alto e apostava pesado
numa banda iniciante:
hippies ingleses esperam ansiosamente o Marquee abrir para ver o Pink Floyd!!! |
Peter Jenner: Eu tinha um pé atrás com
as bandas de blues inglesas – de certa forma, talvez tenha sido por isso que o
Floyd me atraiu, já que, embora tocassem os velhos blues banais de sempre, o
que eles faziam no meio era [...] diferente... Eles faziam passagens bem
estranhas, tão estranhas que eu nem distinguia de qual instrumento vinha o som.
Era bem bizarro e era exatamente o que eu procurava – um grupo pop bem
diferente, eletrônico, muito louco.
cartaz psicodélico de uma das apresentações do Floyd no Marquee em 1966... |
Em 30 de setembro de 1966, o Floyd
(ainda com o nome The Pink Floyd Sound) retornou suas explorações no All Saints
Hall, em Notting Hill Gate, onde participou de um ‘baile comemorativo’,
provavelmente para aa London Free School, que acabara de instalar a sua sede
ali. Depois do baile, Jenner convenceu a diretoria da escola – ou seja, John
‘Hoppy’ Hopkins – a tornar o evento fixo. O retorno da banda, quinze dias mais
tarde, deu início à apresentações semanais, que se estenderiam até o final de
novembro [de 1966]. A essa altura, o Floyd era a vanguarda da psicodelia
britânica. Nesse ínterim, o grupo fez a primeira gravação de ‘Interstelar
Overdrive’, com quinze minutos de duração, o paradigma de suas explorações
psicodélicas, que serviria de trilha sonora para um curta-metragem underground,
‘San Francisco’ (embora jamais tenha ficado claro se a gravação foi feita com
esse propósito).
Para Barrett, foi um verão de
inspiração cristalina [de 1966]. Quando o Floyd fez o seu segundo show na
London Free School, em 14 de outubro, véspera de sua estréia no Roundhouse [outro
clube londrino famosíssimo, na época], o repertório era quase todo de
composições originais, com exceção de ‘louie louie’, e uma canção de Bo
Diddley, ‘I Can Tell’. E essas, como sugeriu o crítico do NME, Nick Jones,
poderiam ser dispensadas, já que ‘versões psicodélicas de louie louie não
funcionam. Mas se eles puderem combinar sua perícia eletrônica com canções com
melodias e letras [...] podem se dar muito bem num futuro próximo’.
1966... |
Na verdade, as tais ‘canções com
melodias e letras’ já estavam ali, num repertório dividido de forma quase
idêntica entre pretextos vagos para o improviso, que atendiam por títulos como
‘Gimme a Break’, ‘Stoned Alone’, ‘Interstellar Overdrive’ e ‘Flapdoodle
Dealing’, e um tipo completamente novo de canção pop, com Syd demonstrando uma
extravagância quase tola em ‘The Gnome’, Matilda Mother’ [essas duas entraram
em Piprer] e ‘Let’s Roll Another One’ (depois rebatizada de maneira careta como
‘Candy & A Currant Bun’). Tudo o que eles precisavam era de um cenário
melhor.
Por ordem de seu empresário, o Floyd
até deu nome a esse amálgama esquizofrênico de estilos pop, adotando a palavra
‘psicodelia’ como descrição ideal do que tentavam fazer. Isso ocorreu bem a
tempo de eles se tornarem os filhos diletos de um underground cheio de energia:
primeiro, por meio do ‘Intenational Times’ [jornal de música da época, e um dos
mais importantes], lançado no mês em que começaram sua temporada na Free
School; depois, em dezembro, quando tornaram a banda residente do clube UFO [o
clube psicodélico mais importante da época, onde lá estive, em agosto de
2014!].
os pais do psicodelismo inglês e mundial!!! |
A rigor, no início o recém-nascido IT
não tinha muita certeza de que o Floyd fosse mesmo tudo isso. Em sua primeira
edição, descreveu um show do Floyd como ‘baile pop’ e ‘psicodelia’; na segunda,
como ‘pop psicodélico’; na terceira, como ‘workshop de som + luz’. Até que,
finalmente, veio ‘o fabuloso e psicodélico Pink Floyd’, na quarta edição. No
número seguinte o jornal fez uma resenha sobre a banda, com Norman Evans
descrevendo ‘seu trabalho como improvisação na maior parte do tempo [...] o
guitarrista Syd Barrett carrega nos ombros o peso de dar continuidade e
agressividade às partes improvisadas [...] com amplo espectro de sons [...] de
guinchos estrangulados a suaves rugidos de microfonia.’”.
Ainda bem que ‘psicodelia’ era um
termo tão novo que resistia a uma definição, pelo menos no contexto pop. Assim
como o ‘folk-rock’, fenômeno do verão anterior [1965], estava totalmente
sujeito a interpretações. Ninguém sabia muito bem o que qualificava a
psicodelia da Costa Oeste, embora o termo fosse onipresente por lá. Sem dúvida,
em outubro, já era tão comum que Brian Wilson [líder dos Beach Boys] pode
prever que ‘a música psicodélica vai cobrir toda a face da Terra e cobrir todo
o cenário da música popular. Tudo o que acontece é psicodélico’. Mas que
definição exata!
Na mesma semana em que a declaração de
Wilson apareceu na revista ‘Go!’, a ‘Melody Maker’ trazia uma matéria de duas
páginas intitulada ‘Psychedelic The New In-Word’ [Psicodélico: a nova palavra
do momento], na qual Graham Nash convenientemente explicava que a psicodelia
era ‘a tentativa de criar uma sessão de LSD sem o uso de drogas’, parafraseando
assim a definição de Frank Zappa para um ‘freak out’: Uma tentativa de alcançar
o mesmo efeito de tomar ácido, mas sem a parte ruim.
em Chelsea, no começo de 1967... |
Mesmo que ninguém admitisse, a ligação
entre Byrds, Fugs e Floyd era simples – e vinha em tabletes. Artistas e público
estavam alterados na maior parte do tempo, daí as improvisações errantes dos
primeiros e a aceitação bondosa do último. Mas até mesmo o novato Floyd sabia
que era preciso cautela antes de tornar essa conexão evidente no mês em que a
dietilamida do ácido lisérgico foi decretada ilegal.
Quando um jornalista do ‘Sunday Times’
perguntou a Andrew King, agente da banda, sobre a lendária festa de lançamento
do IT no Roundhouse, ele rebateu: ‘A gente não diz que é psicodélico. Também
não nega. Tampouco confirma. Deixamos isso para quem tem que criar slogans’. Da
mesma forma, quando um jornal universitário pediu uma declaração do Floyd antes
de um show em fevereiro, ouviu: ‘Nossa música é uma experiência completa, assim
como tomar drogas. Mas não pretendemos reconstruir os sentimentos de ninguém
sob efeito do ácido.’. Em abril de 1967, eles já se distanciavam de tudo que
fosse psicodélico, chegando a criar um anúncio de gozação que convocava as
pessoas para uma ‘Piração-Pura Ação’ (Freak-Out Shmuck Out), na qual poderiam
‘chegar, pagar, se jogar’. De forma quase profética, a banda também rotulou sua
música como ‘pop psicodélico esquizofrênico’.
Barrett já começara a demonstrar um
fervor messiânico pelo que (ele achava que) estavam fazendo. Independentemente
do que a banda dizia à imprensa, o novo som do Pink Floyd e as músicas que ele
vinha compondo eram total reflexo de uma estética do ácido. Como Jenner diria
depois, ‘Syd ficou muito entusiasmado com o ácido e mergulhou no lado
religioso’. Seu sócio King sugere que ele tinha uma fé bem específica ‘numa
espécie de revolução gnóstica e poética que acontecia em seu corpo e no mundo’
Porém, naquele momento Syd ainda estava mais propenso a chapar com maconha em
vez de arriscar muitos sonhos lisérgicos:
Peter Jenner: [A cena] não era muito
psicodélica [em 1966]. Fumar maconha [sim], mas não rolava muito ácido. A gente
já tinha lido a respeito, mas não era fácil encontrar. E as únicas pessoas [no
Floyd] que fumavam, a ponto de ser digno de nota, eram eu e Syd. Na época,
Roger Waters tinha certeza de que eu era um traficante.
cartaz, do final de 1966... ao fundo, o retrato do show de luzes que o Floyd fazia nos shows, que tentava refletir - parte - dos efeitos das visões de quem toma ácido... |
Se antes o Floyd fazia parte de um
underground pop desunido, tudo mudou com a festa do IT no Roundhouse, na noite
seguinte ao segundo show na Free School. Em 15 de outubro [de 1966], de acordo
com os pôsteres espalhados pelo norte de Londres, aconteceria a festa de todas
as festas, uma ‘Rave de uma Noite inteira’, que pedia aos farristas para
‘trazer seu veneno, trazer flores e encher [sic] balões’. O Floyd era a segunda
atração principal da noite, depois de uma banda vizinha de Londres, o Soft
Machine, mais uma banda de jovens músicos disposta a improvisar no contexto
pop, o Soft Machine era um esquisito e (brevemente) maravilhoso amálgama de
fanáticos por jazz e Canterbury, um poeta/muso maconheiro e um pretendente a
compositor cujas canções eram fora do padrão o suficiente para serem estranhas
e melódicas o bastante para serem pop [Soft Machine... bandaaaaaça da
época!!!].
Embora o show no Roundhouse tenha sido
bem mais ou menos para as duas bandas, foi um evento repleto de significado,
uma festa de debutante do underground londrino. E, como tinha as melhores
canções, mais presença de palco e um show de luzes adequadamente psicodélico, o
Floyd acabou sendo notado por todos da plateia que pararam um pouco de olhar as
estrelas no céu para ver a que estava no palco. Barrett já era o astro do show,
algo que o novo letrista do Cream, Pete Brown, percebeu na hora: ‘Fosse ou não
por causa das drogas [...] Syd sempre parecia estar num nível alto de
inspiração que, sendo cruelmente honesto, estava além do que o restante da banda
conseguia tocar’.
uma noite no Roundhouse, por volta de 1966... Estas imagens eram conseguidas com derramamento de óleo em slides, projetados por luzes coloridas... Psicodélico!!! |
Também captando tudo naquela noite,
fantasiado de sheik (da Arábia?), estava Paul McCartney, na companhia de
Marianne Faithfull (que pode ou não ter ido fantasiada de freira). Parece que
ele ficou bem impressionado como Floyd e também com o Soft Machine; nos
primeiros meses de 1967, enquanto elaborava sua reação aos inconstantes
parâmetros do pop, ele era visto com regularidade no UFO, acompanhando o
crescimento e o fortalecimento das duas bandas.
Miles: Eu lembro de que certa vez, no
UFO, [Paul] e eu nos sentamos no chão para um show inteiro, e foi um [show]
interminável do Soft Machine, mas ele queria ouvir o que estava rolando –
especialmente o órgão. Eles eram mesmo muito inovadores.
O lançamento do IT atraiu uma enorme
cobertura da mídia – apesar de, em certo momento, o show de luzes do Floyd ter
causado pane na energia elétrica, expondo a natureza precária de uma aventura
organizada com pouco dinheiro e alguma reza - , em parte porque gente como
McCartney, Faithfull e o cineasta italiano Antonioni (que estava em Londres
filmando ‘Blow up – Depois daquele beijo’ queriam ser vistos na cena. Como
disse Jim Haynes, cofundador do IT: ‘[A festa] lançou o jornal e também o
Roundhouse como um local’.
Apresentação no "Games for May", maio de 1967... |
(...) Então, chegou a vez do Floyd [de
tocar no Roundhouse, após o The Who], que voltava a seu elemento, mas também
estava exausto depois de vir correndo pela A11 logo depois de tocar horas antes
em outra festa de Ano Novo no Cambridge Technical College. Eles compensaram
tocando num volume ensurdecedor, liderados por um Barrett que parecia
perigosamente à beira do abismo. Quanto a Towshend [Pete, guitarrista e
letrista do Who], foi a primeira vez que viu Syd, e ele ficou tão maravilhado
quanto assustado:
Pete Towshend: Eu achava bem interessante
o que Syd fazia [...] embora não desse para ouvir muito bem porque ele usava
dois ou três pedais de eco ligados em sequência... Mas, se tinha uma coisa na
qual Syd era inovador, era ficar completamente chapado. Foi a primeira pessoa
que vi totalmente drogada num palco.
Quando Barrett viu no anúncio do show
que seria um ‘Baile Freak-Out Duplo Gigante’, levou os organizadores ao pé da
letra. Quando eles prometeram ‘sons psicodélicos de Mother’s of Invention, Fugs
[...] [e] Radiophonic Workshop’, ele quis comprovar que o público sabia quem
realmente estava ‘por dentro, cara!’, até mesmo aqueles que tinham vindo mais
para ‘ver as luzes bonitinhas’. O Floyd tinha evoluído bastante desde aquele
primeiro Spontaneous Happpening, embora ainda não soubesse bem como registrar
da melhor maneira seu som (e sua fúria) numa fita. Esse desafio se manteve, não
só para eles, mas para todas as bandas que surgiram nos clubes londrinos
naquele ano e que ainda precisavam chegar ao vinil negro, que era o que mais
interessava.
Esta é de 1967 e eles já estavam no famoso estúdio de Abbey Road... |
“Arnold Layne”, o primeiro compacto do
Pink Floyd, foi gravado na primeira semana de 1967, estúdio Soundtechnics, em
Chelsea.
Se o som de ‘Purple
Haze’ [gravada nesta mesma primeira semana] ampliava as fronteiras do pop, o
som e o tema de ‘Arnold Layne’ teriam chocado a todos um ano antes. O NME foi
cuidadoso ao falar a seus leitores, indicando que a música era ‘sobre um rapaz
que acaba preso porque fica louco ao aprender sobre determinados aspectos da
vida’. Syd, o autor, não foi tão recatado e informou à ‘Melody Maker: ‘Arnold
Layne apenas curte vestir roupas de mulher. Muita gente curte – então vamos
encarar a realidade’. O letrista do Cream ficou pasmado com a nova canção de
Syd:
Pete Brown: Provavelmente ‘Arnold
Layne’ foi o primeiro sucesso pop a abordar, com sotaque inglês, as obsessões
culturais inglesas e os fetiches ingleses. Nunca tinha surgido nada parecido;
todo mundo vinha se comportando como norte-americanos.
Clipe "oficial" de Arnold Layne.
UFO CLUB
O UFO foi um dos principais palcos do
Pink Floyd e da psicodelia londrina.
Estive por lá, em agosto de 2014 e deu
um baita trabalho para encontrá-lo. Fica bem distante do centro de Londres,
quase uma periferia!!! Mas, conseguimos chegar lá e hoje é uma construção bem
moderna, um pouco diferente de há 50 anos.
O UFO, em 1966/67 e hoje... Descendo esta avenida, à direita, tem uma estação de metrô e, mais abaixo, uma via expressa... fomos até lá à pé e voltamos... |
Heylin conta-nos:
O UFO Club (...)
abriu suas portas na Tottenham Court Road para sua primeira noitada semanal em
23 de dezembro de 1966 e fechando-se pela última vez em 28 de julho de 1967.
Nos primeiros cinco meses, recebeu apenas bandas ‘underground’ – ‘fãs do Move’
estavam barrados. Isto é, até que Joe Boyd [empresário do Move e do Pink Floyd]
insistiu – e lembrou à equipe que era em sua maior parte dele a ideia do clube:
Na estréia do UFO - 23 de dezembro de 1966, o Pink Floyd foi sua atração principal!!! |
Joe Boyd: A maioria do público do UFO
só queria se chapar, transar e ouvir boa música. Eles acreditavam nos objetivos
do movimento [hippie], mas não estavam preparados para alcança-los, abrindo uma
trincheira na linha de frente... Mas nada simbolizou tanto minha apostasia
junto aos olhos radicais quanto marcar um show do Move... Estava determinado a
apresentar os meus falsos psicodélicos favoritos, mas quando a equipe soube
disso, ficou horrorizada.
O show do Move no UFO em maio, no
primeiro aniversário do ataque aural de Dylan no Abert Hall, marcou mais um
cisma. Sua apresentação, um mês depois da psicodelia bem mais falsa da banda de
um só sucesso The Smoke (de ‘My Friend Jack’), indicava que os infiéis não
rondavam mais os arredores. Tinham chegado ao santuário secreto. Não importa o
que os músicos comunicassem, para os devotos do UFO era inaceitável uma banda
psicodélica que não tomava drogas psicodélicas.
as outras bandas da época... "Tomorrow" era a banda de Jon Anderson, vocalista que depois fundou o YES, junto com o saudoso baixista Chris Squire, minha segunda banda favorita!!! |
No entanto, na opinião de Miles, ‘o
Move fez um dos melhores shows de sua vida [...] mas ainda assim as pessoas não
gostaram muito. Achavam que a repentina conversão do grupo à causa hippie era
hipócrita e também não gostaram dos fãs com roupas de pelo de cabra que vieram
junto’. Parece ter passado despercebido o fato de o queridinho do underground
Pink Floyd – que tocou em quase todas as noites do UFO entre 23 de dezembro de
1966 e 21 de abril de 1967 – ter gravado no fim de semana anterior seu segundo
compacto e a última faixa de seu álbum de estreia, ambos feitos para inserir a
banda no reino do estrelato pop.
Sem levar em conta sentimentos
pessoais, naquele fim de semana de maio acabou o sonho do aparentemente
benéfico porém confuso UFO. Chegava a algumas lojas do West End, uma semana
antes de seu lançamento oficial, um certo álbum com capa dupla e as letras das
músicas na contracapa, às quais era possível dar quase qualquer significado. O
elo entre psicodélicos e pop se tornava oficial. Os Beatles retomavam a
cruzada. Era hora de reclamar a cidadela de volta.
SGT. PEPPERS E PIPER – ANTES E DEPOIS,
DEPOIS E ANTES
Um homem chamado Norman [Smith,
produtor do Floyd], vestindo uma camisa roxa, chegou. Ele tinha sido uns dos
engenheiros de som, mas agora tinha sua própria banda. The Pink Floyd. Muito
educado, perguntou a George Martin se seus garotos poderiam entrar para ver os
Beatles trabalhando. George sorriu, mas nada fez para ajudar. Norman disse que
talvez devesse pedir pessoalmente a John [nesse tempo ele ainda era o líder dos
Beatles], como um favor. George Martin disse que não, isso não funcionaria.
Mas, se por acaso ele e os rapazes aparecessem por volta das onze, ele veria o
que podia fazer. Eles apareceram às onze, e trocaram alguns olás tímidos”.
Hunter Davies, A Vida dos Beatles, A Única Biografia Autorizada.
Era noite de 21 de março de 1967. Os
Beatles davam os toques finais a ‘Getting Better’ e ‘Lovely Rita’, no Estúdio
dois. Hunter Davies por fim convencera os rapazes a deixar que ele os visse
trabalhando em estúdio. Enquanto isso, do outro lado do corredor, no Estúdio
três, o Pink Floyd trabalhava na surpreendentemente percussiva ‘Pow R Toc H’
com seu produtor Norman Smith, a quem pediram ‘com insistência’ para serem
apresentados aos Beatles – pelo menos é o que se conta.
o Floyd em Abbey Road... mais ou menos em junho/julho de 1967... |
A versão de Davies sobre o famoso encontro
entre Floyd e os FabFour é a normalmente citada, e sugere um acontecimento
corriqueiro, de pouca importância. No entanto, Davies era (e é) biógrafo
profissional, não jornalista de música, e sua ignorância sobre o Pink Floyd era
evidente. Ao que parece, ele também não sabia que Lennon estava ‘alto’ como Mr.
Kite, por ter ingerido sem saber um tablete de ácido (que, supõe-se, imaginava
ser anfetamina). Assim, Lennon não estava em condições de conhecer ninguém, nem
mesmo alguém como Syd Barrett, mais do que capaz de se garantir num duelo de
consumo de ácido.
É impossível não detectar certa ironia
no fato de Syd Barrett ter feito o papel de careta naquela noite no Estúdio
dois, e de ser Lennon quem passou o dia viajando. É possível que Syd ainda se
visse como aprendiz de feiticeiro. Se foi esse o caso, estava prestes a ter uma
amostra de quão intenso – e tedioso – o trabalho dos feiticeiros se tornara.
Segundo Peter Jenner, ‘ficamos lá por uma ou duas horas, e tudo o que eles
fizeram foi um final de música. Interminável.’ Ficou claro para todos que havia
uma diferença fundamental nas abordagens das duas bandas:
apresentação para a TV inglesa, em 1967... |
Jeff Jarrett [Engenheiro da EMI]: O
Floyd criava ambientes e atmosferas sonoras, enquanto os Beatles faziam grandes
canções [...] depois de passarem muito tempo tentando criar sons interessantes
que ajudassem a aprimorá-las.
McCartney já sabia disso. Ao contrário
de Lennon – que, na verdade, não ouviria o Pink Floyd até o ’14-Hour
Technicolour Dream’, em Alexandra Palace, no final de abril - , Macca vinha
demonstrando um vívido interesse pela banda de Barrett desde outubro do ano
anterior, quando os viu no lançamento do IT e tornou-se um frequentador das
noites do UFO, em que o Floyd e o Soft Machine se revezavam para entreter os
freaks. Miles, seu confidente ocasional, já tinha sido fisgado pela banda.
cartaz promocional do grande evento debutante da psicodelia inglesa... quando ela saiu um pouquinho do underground londrino... |
anúncio no jornal International Times, da época, do 14-Hour... |
John e Marianne Faithfull, no 14-Hour... O dia em que ele conheceu e viu o PINK FLOYD e Syd Barrett!!!! |
Miles: Ele sabia que eu curtia o Pink
Floyd. Conversamos várias vezes sobre tentar introduzir a eletrônica moderna e
ideias de outras áreas [musicais], jazz muito avançado, [porque] todos esses elementos
eram o futuro do pop... Que eu saiba, esse era o grande interesse no Pink
Floyd. Eles pareciam estar levando as coisas neste rumo, e foi provavelmente
por isso que ele foi até o UFO.
Paul tinha ficado impressionado o
bastante com o que ouvira no lançamento do IT, para não ficar calado, e uma
resenha na edição de novembro [de 1966] afirma que a banda tinha conseguido
‘amplificadores maiores, novo equipamento de luz e elogios de Paul McCartney. Quando o UFO foi aberto, no final de
dezembro, ele era presença tão constante quanto o Floyd. De fato, sua principal
lembrança do clube, conforme rememorou em conversa com Jonathon Green décadas
mais tarde, era de ter visto ‘a primeira encarnação do Floyd. Eles se
apresentavam lá com muitas projeções, muita gente perambulando... Parecia um
parque de diversões viajandão, na verdade’. E, quando fez seu apelo em prol da
tolerância por todas as coisas psicodélicas na TV Granada no final de janeiro,
foi em grande medida em benefício do Floyd. Sendo assim, é bem difícil
acreditar que McCartney tenha demorado um mês inteiro, após a primeira ida do
Floyd a Abbey Road, em 21 de fevereiro, para ver como eles estavam indo ou dar
um alô. De fato, ele não esperou muito tempo para dar uma passada por lá.
uma das apresentações no UFO.... |
Miles: Lembro-me de ir a uma das
sessões de gravação dos Beatles e ver um dos roadies do Floyd, que disse que
eles estavam gravando lá. Então acho que a primeira vez que algum dos Beatles
foi vê-los no estúdio foi quando levei Paul. Falei que a banda estava lá e ele
respondeu: ‘Vamos lá dar um oi’. Fomos só Paul e eu. Ele já os conhecia do UFO.
Eles estavam em pé no estúdio, gritando para a janela da cabine de controle
porque não haviam percebido que podiam falar ao microfone. Lembro-me de Paul
tentando deixa-los à vontade.
O fato de os rapazes de Cambridge
agirem tão em desacordo com os procedimentos de um estúdio da EMI com certeza
indica que esse encontro ocorreu já na primeira vez que eles ultrapassaram os
portais de Abbey Road. McCartney estava no estúdio na noite do dia 21, fazendo
os overdubs finais em ‘Fixing a Hole’, um trabalho leve. O Floyd, por outro
lado, tinha muito a fazer. Syd, é claro, sempre tinha tempo para McCartney.
Segundo Peter Bown, engenheiro de som do Floyd, o sentimento era mútuo:
‘McCartney disse a Barrett que gostou do que ouviu da banda e achava que eles
estavam fazendo algo único e criativo’. Um endosso por excelência, que o
produtor do Floyd, Norman Smith, certamente levou em conta.
cartaz de 1966... |
Na verdade, após Smith levar a banda
ao conhecimento de seu chefe, Beecher Stevens, as negociações continuavam sem
ele. Já havia um compacto gravado [Arnold Layne/Candy and Currant Bun], uma
oferta da concorrência na mesa e (supõe-se) o endosso expresso de James Paul
McCartney. Mas os empresários do Floyd estavam dispostos a garantir que
qualquer contrato assinado colocasse como prioridade a gravação de um álbum, e
não apenas mais compactos pop. Como diz Peter Jenner, ‘fomos a primeira banda a
ser contratada pela EMI para fazer um álbum. Não precisávamos ter compactos de
sucesso antes da permissão para o álbum’.
Syd, em Abbey Road... |
Porém, havia, sim, condições, e uma
delas tinha a ver com Norman Smith. Stevens disse a Rick Sanders, em 1974: ‘Um
dos rapazes do grupo [...] parecia um pouco estranho, um dos motivos pelos
quais eu quis Norman Smith como produtor. Achei que ele conhecia a música deles
bem o bastante para manter pulso firme nas sessões’. Na verdade, Smith não
poderia estar mais distante da estética do Floyd. No entanto, independentemente
de qualquer acordo com a AIR, a EMI jamais aceitaria um produtor de fora
trabalhando com uma banda tão inexperiente. E Smith tinha ‘direitos
adquiridos’. Havia ainda a sensação geral – inclusive dos empresários do grupo
– de que o Floyd precisava de alguém que trouxesse à tona a inquestionável sensibilidade
pop das canções de Barrett:
Peter Jenner: [Norman] usou seu
conhecimento profissional como um advogado faria. Seu trabalho era produzir um
disco. Não me lembro de ele ter vindo conversar conosco [sobre o contrato]. Quem
tratou disso foi a EMI. Mas o que acho que Norman fez transformar as canções em
músicas de três minutos, a partir de viagens de seis, sete minutos. Joe fez o
mesmo – mas Norman foi mais bem sucedido... Syd na verdade compunha na
estrutura padrão das canções pop, mas ao vivo eles improvisavam longos trechos
instrumentais. Quando começou a trabalhar com eles, Norman pensou: ‘Isso não
vai funcionar’.
A inexperiência do Floyd com certeza
ficou evidente na primeira sessão, e não só porque eles não sabiam usar os
microfones do estúdio para falar com a mesa de controle. Quando começaram a
gravar ‘Matilda Mother’, uma das primeiras composições de Barrett, o fizeram em
um volume ensurdecedor. O engenheiro Peter Bown conta que ‘destruímos quatro
microfones muito caros naquela primeira noite. Eles aumentavam o volume cada
vez mais, até tudo ficar sobrecarregado e os microfones pifarem’.
Abbey Road, entre maio/julho de 1967. |
Também foram gravados na primeira
noite, pelo menos segundo os registros do estúdio, versões de ‘Arnold Layne’ e
‘Candy and Currant Bun’. Isso parece pouco provável, já que as versões
produzidas por Boyd estavam no calendário de lançamentos da EMI para meados de
março [de 1967]. No entanto, um acetato do lado B, contendo a mesma base, mas
com letra e mixagem diferentes, um novo vocal e uma passagem de teclado
adicional, confirma que pelo menos uma delas passou por uma cirurgia de
reconstrução. Segundo Boyd, ‘a EMI nos fez voltar atrás e mudar o verso ‘I’m
high, don’t try to spoil my fun’ [estou chapado, não tente estragar minha
diversão]. Na verdade, a faixa passou por uma reinvenção completa por exigência
da EMI, transformando-se da explicitamente sugestiva ‘Let’s Roll Another One’
para adocicada ‘Candy and Currant Bun’.
Em vez de anunciar o Floyd como a
primeira banda psicodélica da Inglaterra, a EMI decidiu fazer exatamente o
oposto. O primeiro informativo de imprensa da banda incluía a declaração
imortal: ‘O Pink Floyd não sabe o que as pessoas querem dizer com pop
psicodélico e não tenta criar efeitos alucinatórios no público’. Continua a ser
um mistério o motivo de a gravadora estar tão preocupada com as possíveis
interpretações do primeiro lado B do Floyd depois de lançar um lado A depravado
a ponto de ser banido, entre todas as emissoras possíveis, justamente pela
rádio pirata Radio London. Felizmente, ‘Arnold Layne’ sobreviveu intacta a
qualquer pós-produção que tenha ou não ocorrido no dias 21, e foi entregue à
apreciação do público, que acolheu o cheirador de calcinhas de Barrett em seus
corações.
Syd, antes de uma apresentação para a TV, que não foi ao ar... |
Se a sessão do dia 21 foi pouco mais
do que um exercício, o trabalho em Piper at the Gates of Dawn começo no máximo
seis dias depois, com uma sessão de sete horas de gravação que se prolongou até
as duas e quinze da manhã. De novo, foi a equipe de gravação quem pagou o preço
de trabalhar nesse horário ingrato, tendo menos acesso que o Floyd ao que Dylan
gostava de chamar de ‘remédio poderoso’. É provável que tenha sido nessa sessão
que, segundo o baterista Nick Mason, ‘repassamos o repertório para escolher uma
música e começar a gravar e impressionar nossos novos camaradas. Infelizmente,
todos tinham gravado até tarde no dia anterior. Depois de meia hora, Peter Bown
caiu no sono em cima do console e Norman [...] fez o mesmo pouco depois’.
Após a soneca, o trabalho recomeçou
com ‘Chapter 24’, assim chamada porque a letra foi tirada do Capítulo 24 do
I-Ching (na tradução de Wilhelm Reich). Cinco takes foram suficientes e então,
sentindo que haviam aprendido a brincadeira, o Floyd partiu para uma tentativa
de gravar sua marca registrada, ‘Intertellar Overdrive’, que a banda já via
como peça central do álbum. O desafio era produzir a sensação ode espaço e de
ausência do tempo que ela tinha no UFO, mas mantendo certos limites, para que a
música não fugisse ao controle.
‘Interstellar’ foi a única música nas
sessões de Piper que a banda já havia gravado em estúdio. Na verdade, tinha
feito isso duas vezes, com um intervalo de dois meses e meio entre elas. Em
ambas gravações, a música ultrapassou a marca de quinze minutos, enquanto os
músicos tentavam reproduzir a sensação do show ao vivo no estúdio (o que nunca
é tarefa fácil). A primeira versão, gravada no final de outubro do ano anterior
num minúsculo estúdio de dois canais em Herts – Hemel Hempstead, para ser exato
-, foi usada como trilha sonora de um filme underground. Era, como afirma
Andrew King, ‘muito ao vivo – era como se eles estivessem tocando num show’.
Abbey Road, julho de 1967... Syd já estava começando a "não querer saber..."... |
Essa viagem sonora – todos os quinze
minutos e onze segundos – demonstra uma clara analogia transatlântica com o que
o Velvet Underground fazia em Nova York durante o período do Exploding Plastic
Inevitable [Série de eventos multimídia organizados por Andy Warhol em Nova
York entre 1966 e 1967, que contava, entre outras atrações, com apresentações
do Velvet Underground], quando a banda criou uma estrutura básica – eles a
chamavam ‘Melody Laughter’ – em torno da qual desenvolvia qualquer feitiço
sônico que se manifestasse. Já o Floyd não era muito consistente na tarefa de
limitar uma música a um determinado arranjo. Ou até era. O trabalho de Mason e
Waters na gravação de outubro não conseguiu dar a sustentação necessária, e era
bem complicado trazer a música de volta ao chão. No entanto, segundo Andrew
King, ‘se deixassem, Syd teria improvisado a mesma sequência de acordes a noite
toda. Roger deu [a ‘Interstellar Overdrive] as fronteiras dinâmicas dentro das
quais Syd podia mover-se com liberdade’. Se esse foi mesmo o caso, essas
‘fronteiras dinâmicas’ ainda estavam por ser traçadas em outubro de 1966.
Estúdios de Abbey Road, 1967... |
Quando Joe Boyd os colocou no Sound
Techniques, em janeiro do ano seguinte, eles já tinham shows no All Saints, no
Roundhouse e no UFO em seu currículo multicolorido, além de um engenheiro de
som e um produtor de verdade para guia-los. O resultado: um salto gigantesco em
direção à originalidade. O resultado mais uma vez tinha como objetivo a trilha
sonora de um filme, o retrato pseudodocumental da Swinging London por Peter
Whitehead, ‘Tonite All Make Love in London’. Como sempre, a moderação não
estava na ordem do dia, já que Whitehead pretendia escolher cuidadosamente
fragmentos que impressionassem, pintando belas imagens psicodélicas para passar
as horas (sim você acertou, o filme é mais uma daquelas obras mais bem
apreciadas quando se está chapado).
"Esta noite, todos fazem amor em Londres"... 1967...
Assim, a ‘Interstellar Overdrive’ de
janeiro tinha quase dezessete minutos, uma duração sem precedentes para
qualquer faixa (talvez, a comparação mais próxima seja o Love, uma das bandas
favoritas de Barrett, cuja ‘Revelation’ ocupa todo o lado B de ‘Da Capo’, sem
revelar muita coisa). O Floyd também fez outra jam psicodélica de doze minutos
à moda UFO, ‘Nick’s Boogie’, para uma posteridade tardia [as gravações de
Interstellar e Nick’s não apareceriam até 1990, quando a gravadora See for
Miles, lançou em CD uma versão ampliada do LP com a trilha sonora original].
Essa sessão tinha o objetivo de documentar o Pink Floyd psicodélico, não os
futuros astros pop que Boyd também registraria sem esforço, duas semanas
depois, em ‘Arnold Layne’, uma gravação que Norman Smith não conseguiu
melhorar.
Enquadrar ‘Overdrive’ foi o maior
desafio de Norman Smith naquela primavera. Ele já tinha percebido onde estava a
fonte de poder da banda: ‘Syd tinha mesmo o controle. Ele era o único que
compunha, o único que eu, como produtor, tinha que convencer das minhas
ideias’. Porém, ele estava prestes a descobrir que, além de ideias próprias
bastante definidas, Barrett possuía um espírito relutante sob aquela aparência
charmosa e jovial. Smith revelou recentemente: ‘Sempre senti que pisava em ovos
o tempo todo, e tinha que prestar muita atenção ao que dizia a Syd. Ele sempre
foi extremamente frágil... Mas havia também uma certa teimosia nele’. Essa
tendência à teimosia não se manifestava em confrontos verbais, como podia
acontecer com alguém descontrolado como Lennon, mas sim na determinação de quem
não seria desviado de seu rumo pelo ultracertinho Smith:
Norman Smith: Ele começava a cantar
uma música e eu o chamava à cabine de controle para dar algumas instruções.
Então ele saía e não cantava nem a primeira parte igual, muito menos o trecho o
qual tínhamos conversado. Às vezes ele mudava a letra – ele simplesmente não
tinha disciplina.
Na verdade, Barrett demonstrou muita
disciplina nessas sessões, lapidando alguns dos maiores manifestos de expressão
da mente do mundo hippie até obter a superfície lustrosa de canções pop
altamente acessíveis, revelando estar mais para camaleão que para papagaio.
Bown, o engenheiro de som, diz: ‘Syd era menos rígido sobre o que podia e o que
não podia ser feito. Ninguém nunca entendeu direito o Pink Floyd,
principalmente Norman. O Pink Floyd era diferente, e tinha que ser diferente’.
A primeira ‘Intertellar Overdrive’ da EMI foi gravada em dois takes, ambos por
volta da marca de dez minutos, no final de uma longa sessão. Assim como
aconteceu com ‘Arnold Layne’, ela foi considerada amplificada, mas
inevitavelmente ficou aquém do que podia ser ao vivo (algum tempo depois, Pete
Townshend criticou o álbum por ter ‘tão pouco a ver com o que eles faziam ao
vivo. Ficou parecendo bubblegum [chiclete de bola, atribuído às músicas
exclusivamente comerciais, com letras e melodias simples, com apelo para o
público infantil e adolescente] – música de Mickey Mouse’, embora a mesma
‘crítica’ possa ser feita ao Who, em 1967). Mas tudo se resumia ao que Jenner
havia dito a uma cética repórter de rádio canadense: ‘Se o som que eles fazem
nos clubes tocar no rádio enquanto você lava louças, provavelmente vai deixa-la
histérica!’.
Ainda que a ‘Interstellar Overdrive’
de 27 de fevereiro fosse um grito mudo, não seria o último. Quando voltou a
Abbey Road, em 16 de março, após rodada de shows e trabalho promocional para
‘Layne’, a banda concordou em produzir uma versão mais resumida para um
compacto a ser lançado na França, presumivelmente acreditando que os primos
continentais não suportariam todos os dez minutos da viagem (na verdade, a
França foi o único lugar do mundo a lançar a versão de onze minutos de ‘Goin’
Home, dos Rolling Stones, nos dois lados de um compacto, ou seja...). Usando a
base de 27 de fevereiro, eles inseriram um final pirado à música no lugar do
costumeiro salto borbulhante no hiperespaço. Ainda assim, não deixariam sua
música mais característica de lado. Novas pinceladas seriam aplicadas no
estágio de mixagem.
Por ora, é necessário retornar a
algumas estranhas histórias da vasta coleção de lendas sobre o líder da banda.
Se em sua primeira nota biográfica divulgada à imprensa pela EMI ele reclamou
sobre ‘não ter mais tempo para ler contos de fadas’, Barrett ainda encontrava
tempo para escrevê-los. Embora o Floyd encontrasse pouca resistência da
gravadora quanto aos seus cansativos métodos de trabalho e seu estilo de vida
notívago – seguindo o caminho aberto pelos Beatles em ambos os casos - , a
agenda da banda não era flexível como a do grupo de Liverpool. Definitivamente
eles não estavam aposentados da estrada. Conforme observa Mason, ‘com
frequência ainda usávamos o estúdio à tarde e íamos fazer shows à noite’.
A solução foi arranjar um conjunto de
sessões em meados de março para fazer o grosso do álbum. Após a produtiva
sessão de 16 de março, a banda decidiu passar três dias da semana seguinte
produzindo material suficiente para que as encomendas do disco começassem a ser
feitas. Quando conheceram um Lennon fora de órbita e ouviram fragmentos do que
os Bealtes estavam prestes a oferecer ao mundo, os rapazes de Cambridge já
tinham gravado mais cinco decolagens em quatro dias de trabalho, contínuo no
estúdio: ‘Flaming’, The ‘Gnome’, ‘Take up Thy Stethoscope’, de Roger Waters,
‘The Scarecrow’ e ‘Pow R Toc H’.
Enquanto ‘Stethoscope’ e ‘Pow R’ eram
antigas favoritas dos shows, ‘Flaming’ era um acréscimo recente de Barrett e
seu cancioneiro. Baseada em ‘I Come and Stand at Every Door’, dos Byrds – por
sua vez baseada na velha cantiga folclórica do norte escocês ‘The Great Silkie
of Sule Skerry’ – ela não se contentava em subir meras oito milhas. Após Syd
cantar ‘Hey, ho, here we go/Ever so high’ [Ei, ô, aqui vamos nós/muito mais
alto], vinha a representação sonora de uma experiência psicodélica –
supostamente inspirada por um piquenique regado a bolinhas nas margens do Rio
Cam no outono de 1965 - , o que desmentia a alegação da EMI de que a banda de
Barrett não tentava criar efeitos alucinatórios no público.
Se nos estúdios eles dependiam apenas
dos equipamentos de gravação para criar esse submundo dos sentidos – como show
de luzes eo PA ensurdecedor fora da jogada - , tinham em Abbey Road um dos
estúdios mais bem equipados do mundo para efeitos sonoros, ainda que
precisassem ser gravados em quatro canais. Nessa era pré-digital, Nick Mason,
ficou abismado ao descobrir que o ‘império da EMI possuía enormes quantidades de
instrumentos espalhados pelos estúdios... Uma extensa biblioteca de efeitos
sonoros também estava disponível, além de câmaras de eco, bem construídas e
revestidas de ladrilhos, que eram nossas preferidas para gravar o som de
passos’.
foto histórica em Piccadilly Circus, 1967... |
Embora Norman Smith não tivesse a
experiência de George Martin para incorporar efeitos sonoros – amplamente
utilizados nas gravações cômicas que construíram a reputação de Martin na
Parlophone - , toda sua equipe tinha prática no ADT, que foi aplicado com
liberdade à maioria dos vocais de Barrett, em especial nas canções mais
etéreas, como ‘Flaming’ e ‘Astronomy Domine’. O Binson Echorec foi outra
ferramenta que provou que a única diferença entre homens e meninos é o preço de
seus brinquedos, e com a qual eles se esbaldaram:
Nick Mason: O Echorec faz com que
quase qualquer instrumento soe como se tivesse sido gravado por Thomas Edison
em pessoa, já que provoca um aumento de ruído branco, mas isso era só parte da
graça.
Enquanto os Beatles experimentavam com
os sons do Oriente, o Floyd preferia beber das tradições igualmente ricas do
Ocidente – combinando música clássica e folclórica. Para ‘The Gnome’, com letra
de contos de fadas à la Irmãos Grimm, eles fizeram um arranjo quase coral.
Usando uma celesta (espécie de órgão um tanto desafinado, mas de forma
proposital) que alguém havia ‘deixado no estúdio, de uma sessão anterior’, eles
deram à música sua sonoridade etérea, de outro mundo. Como Mason contou a John
Cavanagh, esse tipo de espontaneidade foi uma das características dessas
sessões, ‘há um certo ar aleatório em Piper, que é baseado no que acontecia na
época’.
Abbey Road, 1967. |
Mesmo antes de 21 de março – quando o
Floyd terminou o seu ataque ininterrupto ao álbum e conheceu os outros Beatles
- , McCartney evidentemente vinha observando o progresso da banda. Uma breve
menção às gravações no Melody Maker daquela semana relatava que o ‘Beatle Paul
McCartney já apareceu várias vezes nas sessões’; Andrew King lembra que
‘McCartney era muito amistoso. Ele vinha vez ou outra ao estúdio quando
estávamos gravando’. Estaria ele preocupado que o Floyd pudesse chegar ‘lá’
primeiro?
Com oito composições próprias gravadas
– e ainda faltando dez para os Beatles concluírem o trabalho em estúdio de Sgt.
Pepper’s - , talvez tenha passado pela cabeça dos rapazes do Floyd que seu
álbum, iniciado havia um mês, estaria pronto para lançamento quase ao mesmo
tempo que o mais novo vinil dos Beatles – principalmente se a pós-produção de
Pepper fosse tão lenta quanto as sessões.
Mas isso não aconteceria. O dia em que
o Pink Floyd chegou a uma base satisfatória para ‘Pow R Toc H’ (que deve ser
ouvida em mono; a mixagem em estéreo lembra um molusco nu pendendo da concha de
sua encarnação mono), o Floyd ficou sabendo que seu primeiro compacto entrara
nas paradas em 33º lugar. Como consequência, eles foram obrigados a deixar boa
parte da mixagem para a equipe de Abbey Road, enquanto saíam em turnê pelos
lugares mais badalados do hedonismo, como Barnstaple, Bromley e Bishop’s Stortfold,
incluindo uma parada para pré-gravar uma apresentação dublada de ‘Arnold Layne’
para o Top of the Pops em 4 de abril – junto com o Move, que também tinha uma
movimentada agenda de shows. Só que, enquanto ‘I Can Hear the Grass Grow’
continuava a subir nas paradas, ‘Arnold Layne’ começou a cair. Quando o Top of
the Pops foi transmitido, no dia 6, a apresentação do Floyd não foi ao ar.
Ainda sem tempo para se comportar mal,
a banda foi obrigada a reservar outra semana de sua agenda em abril para gravar
as duas faixas que faltavam para o álbum entrar em pós-produção no calendário
de lançamentos da EMI e, ao mesmo tempo, arriscar um segundo compacto para
acompanhar a grande estreia em vinil. Uma apresentação no dia 14, em
Newcastle-under-Lyme foi considerada impraticável devido à distância e adiada
para maio, restando apenas dois shows em locais mais próximos de Londres,
Tillbury, em Essex, e Brighton, no litoral sul, para aquela rara semana fora da
estrada. O Floyd estava com força total no expresso em direção ao Prazo Final
do Álbum.
Das duas faixas de Piper gravadas
entre 11 e 18 de abril, ‘Astronomy Domine’, mostrou-se a mais problemática.
Apesar dos catorze takes feitos no dia 11, ela ainda precisou de mais duas
sessões, uma dedicada ao overdub dos vocais e de mais um trecho de guitarra de
Syd; outra noite foi reservada para gravar o ‘canal louco’ que por fim daria à
música (e ao álbum) sua tão impressionante abertura. Isso incluía Peter Jenner
recitando num megafone citações do ‘The Observer Book of Spaceflight’
compiladas por Syd. Por fim, no dia 18, os vocais de Barrett foram tratados com
o ADT e foi feita uma mixagem mono, na esperança de uma conclusão rápida do
álbum.
Dada a atenção aos detalhes conferida
a ‘Astronomy Domine’, fica claro que havia uma firme determinação de começar o
álbum como a banda pretendia, com uma abertura psicodélica. A sessão de 11 de
abril pode muito bem ter sido a que, segundo Bown, ‘eles tiveram muitos
problemas para fazer as coisas progredirem no estúdio’, mas, se foi esse o
caso, o motivo da frustração foi a busca pela perfeição, não a falta de
concentração.
Friends... Roger and Roger... |
Festa de lançamento de Piper... Não poderia ter sido diferente... |
Num dia mais inspirado, a banda
produziria facilmente uma ‘Astronomy Domine’ insuperável num único take, como
foi demonstrado um mês depois, quando uma versão ‘ao vivo no estúdio’ filmada
para o ‘Look of the Week’ da BBC, acompanhada de um atmosférico show de luzes
dirigido por Barrett ofuscou a versão de estúdio, gravada a tão duras penas.
Apresentação na BBC, no "Look for the Week", 1967...
Segundo Ian Moore, amigo da
universidade de Cambridge, a inspiração para a música foi uma das primeiras
viagens psicodélicas de Syd, na qual ele segurava uma ameixa e uma laranja em
cada mão e ‘a ameixa era Vênus e a laranja era Júpiter, enquanto Syd flutuava
no espaço entre os planetas’. Nada podia ser mais distinto em conteúdo do que a
canção que eles começaram a gravar no dia seguinte “Ratchatcher’, ela mais tarde
foi renomeada nos registros do estúdio como ‘Lucifer Sam – Theme from the day
in the life of Percy the Ratchatcher’ [Lucifer Sam – tema de um dia na vida de
Percy, o Caçador de Ratos]. Aparentemente uma canção sobre um gato siamês com
dons mágicos, ela recebeu a mesma atenção cuidadosa aos detalhes que sua
predecessora, com boa parte de uma sessão (no dia 18) dedicada à sobreposição
dos vocais para conferir-lhe um som levemente sibilante.
No dia 18 também foi gravada uma
música que, ao que tudo indica, havia sido escolhida para fazer parte do
compacto seguinte (‘See Emily Play’ ainda não tinha sido composta). Mais tarde
substituída, ‘She Was a Millionare’ seria mencionada ao se falar num terceiro
compacto do Floyd no final de julho. Duas das três versões gravadas no dia 18
foram registradas como concluídas, ambas durando exatamente quatro minutos e
seis segundos, o que sugere que os esforços do Floyd produziram algo
utilizável. No entanto, o fato de não haver uma mixagem final em mono, nem
overdubs adicionais nas sessões de pós-produção, indica que ela foi logo posta
de lado e depois simplesmente esquecida (e descartada).
Àquela altura já havia 38 minutos (ou
seja, a duração de um álbum em 1967) de material novo e aproveitável gravado, a
maioria mixado em mono por Smith e seus assistentes, pronto para apresentar ao
mundo comercial o som antes subterrâneo da psicodelia. Porém, o projeto de
Piper ficou parado quase um mês, enquanto a banda se preparava para os dois
maiores shows de sua carreira até então: o 14-Hour Technicolour Dream, que
aconteceria em Alexandra Palace no último sábado de abril (29) – no qual Lennon
finalmente ouviria o que vinha evitando - , e um concerto especial, com o
público sentado, o Queen Elizabeth Hall na sexta-feira, 12 de maio, intitulado
‘Games of May’. Dividido em duas partes, com um intervalo no meio, ele foi
apresentado como o tipo de recital clássico comumente realizado nesse teatro. O
conceito de ‘Games of May’ fez com que Barrett escrevesse uma canção-tema para
o evento, talvez seu melhor momento pop, ‘See Emily Play’. Mas o atraso
resultante ocasionou que o álbum não ficasse pronto, no mínimo, até julho.
cartaz promocional do 14-Hour... |
O Pink Floyd foi a grande atração do 14-Hour, com Syd em estado de graça!!!! |
Aspecto do 14-Hour... |
Vídeo daquele show histórico... Cliquem e vejam, antes que a louca japa mande tirar ou cobre $$$$!!!
The Syn, banda psicodélica inglesa, que nos forneceu Chris Squire, o maior baixista de todos os tempos!!! O segundo, da esquerda para a direita, no alto!!! |
os hippies foram chegando no 14-Hour!!! |
Embora os dois shows tenham sido
triunfais, rendendo resenhas entusiasmadas e confirmando as credenciais da
banda, na época em que o álbum foi lançado o talismânico líder da banda
começava a agir de forma muito estranha, e o disco – que com certeza se
beneficiaria de qualquer comparação direta com seu contemporâneo Sgt. Pepper –
tornou-se somente mais uma lembrança do verão lisérgico de muitos ex-dançarinos
adolescentes.
uma foto da sequência que foi feita para a capa do disco... |
É portanto surpreendente constatar que
o empresário do Floyd, Peter Jenner, informou ao Melody Maker em 15 de maio que
não só a banda ‘terminava a gravação de seu novo compacto e de seu primeiro LP
esta semana’, como também que o compacto ‘será lançado às pressas em 26 de maio
ou 2 de junho, e o álbum sai em meados de junho’. E ele estava absolutamente
atualizado – de fato, o álbum foi finalizado no domingo seguinte, com ‘Bike’,
que fecha o LP, gravada em doze takes no Estúdio Três. A banda então saiu
voando (bem alto) para o Sound Techniques, em Chelsea, a fim de dar os toques
finais à versão do compacto ‘See Emily Play’, que eles haviam gravado no início
da semana (provavelmente no dia 18).
cartaz promocional... |
Em meio a toda essa atividade, parece
que o Floyd ainda encontrou tempo para desfrutar de uma das poucas regalias
oferecidas pelo contrato com a EMI: uma cópia em primeira mão do mais novo LP
dos Beatles, Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band. Segundo June Bolan, que era
assistente de Jenner e em 1967 assessorava Barrett, ‘naquela’ noite (o dia 22,
supõe-se) o Floyd fez uma grande festa na casa de Jenner para comemorar o
lançamento do álbum que definiria uma era e a finalização de sua própria e
humilde invocação do zeitgeist.
"See Emily Play", no "Top of the Pops", 1967...
Se a agenda maluca da banda, a sede
por perfeição de Barrett e uma certa procrastinação que provavelmente refletia
o aumento do uso de drogas impediram Piper at the Gates of Dawn de competir
cabeça a cabeça com Sgt. Pepper, ainda assim o disco se tornaria o outro pilar
essencial desse verão de sexo e drogas, transformando-se numa genuína trilha
sonora do acid rock.
Piper, então, somente veio ao mundo no dia 4 de agosto de 1967, dois meses depois do lançamento de Sgt. Pepper's, o que sempre nos dava a impressão que Piper seria algo influenciado por Pepper, o que não é verdade! É justamente o contrário!!!
Contracapa e o desenho de Syd... |
Adicionar legenda |
O famoso selo HARVEST, da EMI... |
O maior disco psicodélico da história abalou a Inglaterra!!! |
Há 50 anos, Pink Floyd aparecia para o mundo, com seu grande líder e gênio, Syd Barrett e com seu grande disco, imperdível e obrigatório em qualquer discoteca de rock decente que se preze.
Syd, numa das últimas fotos tiradas dele, em 2003, em Cambridge... Desencarnou em 2006, mas sua genialidade é eterna, para nós, fãs... |
Bem, vamos então às nossas audições...
Hoje também nos é um dia especial, já que, finalmente, conseguimos imortalizar a nossa série em VHS de "Guerra nas Estrelas" (sim, para nós, um pouco mais velhos, é este o título... em português!), que é a primeira versão lançada nos cinemas do mundo, na época... Foi a primeira vez que fui ao cinema, em 1980, para assistir ao "Império Contra-Ataca, que para mim, é o melhor dos três, justamente porque é o que tem mais batalhas espaciais e também porque é a reafirmação de Darth Vader como o símbolo da série. Meus agradecimentos à minha esposa, que me incentivou a imortalizá-la e à Ivete e seu marido, que tornaram isso possível...
Agora, vou armar um receiver Marantz "coringa" aqui na sala, com duas caixas acústicas bem "básicas", e desfrutar do melhor som estéreo da Trilogia recém digitalizada para, logo mais, darmos início a nossa sessão de super cinema!!!
Olhem quem irá figurar nesta noite, em nossa sala, com seus olhos azuis e som aveludado, para transmitir com fidelidade absoluta a respiração de DARTH VADER!!! |
Antes, claro, Syd Barrett e sua nave pedem passagem... Vamos embarcar e ver para qual galáxia ou planeta ele vai nos levar, antes da "guerra nas estrelas"?...
Até a próxima viagem, em Magical Mystery Tour...50 anos!!!!
UAU! Gostei!!
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